23/10/2009
STF - INFORMATIVO DE JURISPRUDÊNCIA Nº 563 - EXCERTOS SELECIONADOS PELA 4ª ICE
Concurso Público para Cargo de Procurador da República e Requisito Temporal
Salientando as peculiaridades do caso, o Tribunal, por maioria, deferiu mandado de segurança para assegurar aos impetrantes o direito que lhes advenha da aprovação no 24º concurso público para provimento do cargo de Procurador da República. Na espécie, o Procurador-Geral da República indeferira a inscrição definitiva dos impetrantes ao fundamento de não restar atendido o requisito de três anos de atividade jurídica previsto no regulamento do certame (Resolução 93/2007) e no art. 129, § 3º, da CF. A Min. Cármen Lúcia, relatora, entendeu que os impetrantes teriam cumprido a exigência de três anos de atividade jurídica, sobretudo em face do que certificado pelo Banco Central do Brasil - BACEN, no sentido de eles exercerem, há mais de dez anos, no cargo de nível superior de analista dessa autarquia — entre as funções inerentes àquelas próprias desses cargos, para o que não se exigia formalmente a condição de bacharel em direito — atividades próprias destes. Observou a circunstância de que, em razão da formação jurídica dos impetrantes, eles teriam sido designados para atividades da procuradoria do BACEN vinculadas ao contencioso. Considerou, portanto, que os impetrantes: a) possuíam mais de três anos como bacharéis em Direito na data da inscrição do concurso; b) tinham habilitação para integrar os quadros da OAB e, nesta condição, poderem advogar; c) comprovaram o exercício de atos de advocacia (contencioso) após receberem a Carteira da OAB (deferimento de inscrição); d) exerceram funções próprias de bacharel no exercício de um cargo no qual essa era uma das possibilidades (conforme atestado pelo BACEN nos documentos acostados aos autos). Ressaltou que, no caso, o não reconhecimento de direito dos impetrantes implicaria afronta ao princípio da igualdade, haja vista a existência de servidores públicos, em cargos não privativos de bacharel em Direito, que são proibidos de advogar e, para esses, o Supremo ter decidido não haver violação à regra que exige a comprovação de três anos de atividade jurídica a partir da colação de grau no curso de Direito. Por sua vez, os demais Ministros que acompanharam a conclusão da relatora reportaram-se, em especial, ao que decidido pelo Plenário no julgamento do MS 26681/DF (DJE de 17.4.2009). Ressaltando faltarem apenas 15 dias para o perfazimento do requisito temporal de três anos de atividade jurídica, levaram em conta o fato de que, de forma similar ao que ocorrera naquele julgamento, os impetrantes, embora tivessem, já habilitados desde 22.6.2005, protocolizado os requerimentos de inscrição no quadro da OAB nos dias 4 e 6.7.2005, teriam tido seu pleito deferido apenas em 2.9.2005. Concluíram que esse atraso de quase dois meses para o deferimento dessa inscrição seria atribuível à OAB, não podendo prejudicar os impetrantes. Vencidos os Ministros Joaquim Barbosa, Cezar Peluso e Ellen Gracie que denegavam a ordem por considerar não observado o mencionado requisito temporal. Outro precedente citado: Rcl 4936/PA (DJE de 11.4.2008).
MS 27608/DF, rel. Min. Cármen Lúcia, 15.10.2009. (MS-27608) Audio
REPERCUSSÃO GERAL
Aplicabilidade Imediata da EC 19/98 e Irredutibilidade da Remuneração - 1
O Tribunal iniciou julgamento de recurso extraordinário interposto pelo Estado do Mato Grosso do Sul em que se discute a constitucionalidade da incidência do adicional por tempo de serviço sobre a remuneração a partir do advento da EC 19/98. Na espécie, o acórdão impugnado dera parcial provimento à apelação dos recorridos, servidores públicos estaduais, para fixar o pagamento do adicional por tempo de serviço com base na remuneração desses servidores até a data de início de vigência da Lei estadual 2.157/2000, que passou a prever a incidência do adicional apenas sobre o salário-base. A recorrente sustenta que os recorridos nunca tiveram o direito de receber o adicional calculado sobre a remuneração, mesmo no período em que não havia proibição expressa na CF, pois a Lei estadual 1.102/90 previa como base de cálculo apenas o vencimento-base mais as vantagens permanentes, não sendo possível falar, assim, em direito adquirido. Alega também ser inaceitável o fundamento de que o conteúdo normativo do inciso XIV do art. 37 da CF, nos termos da EC 19/98, não seria aplicável aos recorridos só pela circunstância de terem ingressado no serviço público antes da alteração constitucional, haja vista o art. 17 do ADCT não permitir o recebimento de remunerações e proventos em desconformidade com a CF.
RE 563708/MS, rel. Min. Cármen Lúcia, 14.10.2009. (RE-563708) Audio
Aplicabilidade Imediata da EC 19/98 e Irredutibilidade da Remuneração - 2
A Min. Cármen Lúcia, relatora, desproveu o recurso, no que foi acompanhada pelo Min. Ricardo Lewandowski. Salientou, inicialmente, que o núcleo da questão debatida seria a aplicabilidade imediata, ou não, da EC 19/98 na parte em que alterou o inciso XIV do art. 37 da CF, tendo em vista a garantia constitucional da irredutibilidade da remuneração, pondo o recorrente também em foco o princípio do direito adquirido. Afastou, em seguida, a alegação de que os recorridos nunca tiveram o direito de receber o adicional calculado sobre a remuneração, porque a Lei estadual 1.102/90 previa como base de cálculo apenas o vencimento-base mais as vantagens permanentes, por se tratar de típica questão de ofensa ao texto legal e não ao texto constitucional. Asseverou, no ponto, que a pretensão do recorrente seria a de que o Supremo corrigisse o tribunal de justiça local quanto à interpretação do texto legal estadual, tendo em vista que essa Corte concluíra, expressamente, no sentido de que a Lei estadual 1.102/90 fixava a remuneração como base de cálculo do adicional por tempo de serviço (“Art. 73 Remuneração é o vencimento do cargo efetivo, acrescido das vantagens permanentes e temporárias estabelecidas em lei ... § 3º - O vencimento do cargo efetivo, acrescido das vantagens de caráter permanente, é irredutível e observará o princípio da isonomia, quando couber. ... Art. 111 O adicional por tempo de serviço é devido por qüinqüênio de efetivo exercício prestado ao Estado, incidente sobre a remuneração de que trata o art. 73, § 3º, desta lei.”). De igual modo, rejeitou a argumentação relativa à incidência do art. 17 do ADCT à espécie. Registrou que, no julgamento do MS 24875/DF (DJU de 6.10.2006), em que examinada a incidência da EC 41/2003, o Plenário do Supremo teria assentado que “o art. 17 do ADCT é norma referida ao momento inicial de vigência da Constituição de 1988 — ‘serão imediatamente reduzidos aos limites dela decorrentes’ — no qual incidiu e, neste momento, pelo fato mesmo de incidir, teve extinta a sua eficácia, tal como é próprio das regras transitórias de efeito instantâneo.”. Assim, reputou impertinente sua invocação no que diz respeito à incidência da EC 19/98, que seria o caso dos autos.
RE 563708/MS, rel. Min. Cármen Lúcia, 14.10.2009. (RE-563708)
Aplicabilidade Imediata da EC 19/98 e Irredutibilidade da Remuneração - 3
No que tange ao inciso XIV do art. 37 da CF, assinalou, primeiro, que seu texto originário previa que “os acréscimos pecuniários percebidos por servidor público não serão computados nem acumulados, para fins de concessão de acréscimos ulteriores, sob o mesmo título e idêntico fundamento.”, e que o Supremo teria construído interpretação centrada, especialmente na parte final desse dispositivo, limitando o alcance pretendido pela Administração Pública, a fim de evitar o “efeito cascata”. Afirmou que a EC 19/98, entretanto, teria alterado significativamente referido dispositivo constitucional, ao passar a dispor que “os acréscimos pecuniários percebidos por servidor público não serão computados nem acumulados para fins de concessão de acréscimos ulteriores.”, assim agindo com o claro escopo de superar a jurisprudência até então fixada pelo Supremo, revelado pela exclusão tão-somente da parte final do dispositivo, fundamento de toda essa orientação jurisprudencial constitucional. Aduziu que, diferentemente do que se tinha com o inciso XI do art. 37 da CF, o inciso XIV não condiciona a sua eficácia, no que se refere à vedação, à edição de lei alguma, isto é, sua aplicabilidade seria imediata, independentemente de qualquer outro ato para produzir efeitos. Ressaltou que, ainda que considerada de aplicabilidade diferida pela eficácia condicionada da norma do inciso XIV do art. 37 da CF, o que não se teria na espécie, a EC 19/98 vigoraria desde a sua publicação, servindo de parâmetro para o exame da constitucionalidade das legislações editadas sob a sua vigência. Dessa forma, diante da aplicabilidade imediata, o art. 37, XIV, da CF, nos termos definidos pela EC 19/98, não teria recepcionado o § 3º do art. 73 da Lei estadual 1.102/90. Frisou que nenhuma legislação posterior à EC 19/98 poderia incluir na base de cálculo de qualquer acréscimo pecuniário à remuneração de servidor acréscimos ulteriores, e que essa fora a razão pela qual o tribunal a quo limitara a condenação do recorrente à vigência da Lei estadual 2.157/2000, que adequou a base de cálculo do adicional por tempo de serviço aos termos da EC 19/98.
RE 563708/MS, rel. Min. Cármen Lúcia, 14.10.2009. (RE-563708)
Aplicabilidade Imediata da EC 19/98 e Irredutibilidade da Remuneração - 4
A despeito de tal conclusão, a relatora entendeu que ela não aproveitaria ao recorrente, tendo em conta a garantia constitucional da irredutibilidade da remuneração. Anotou, antes de adentrar essa questão, que não estaria sendo discutido, na espécie, o conflito de normas definidoras da incidência imediata de teto constitucional e o princípio da irredutibilidade dos vencimentos, consideradas as vantagens individuais, tema remetido pela 2ª Turma ao Pleno no RE 477274/MG. Disse haver diferença substancial entre a aplicação imediata de teto constitucional, cujo objetivo seria exatamente reduzir o montante a ser percebido, com a alteração da forma de cálculo da remuneração, para a qual existe jurisprudência. Prosseguindo, considerou que, apesar da orientação do Supremo segundo a qual não há direito adquirido a regime jurídico, sendo viável a alteração da composição da remuneração dos servidores públicos, a Corte sempre teria resguardado a irredutibilidade dos vencimentos dos servidores, que seria oponível até mesmo às emendas constitucionais que alterem a forma de cálculo da remuneração, conforme entendimento firmado no mandado de segurança supracitado. Em razão disso, conquanto o acórdão recorrido tivesse partido de premissa equivocada, qual seja, de que os recorridos teriam direito adquirido à forma de cálculo preexistente à EC 19/98, não seria possível reformá-lo, porque isso implicaria a redução da remuneração dos recorridos. Após, pediu vista dos autos o Min. Joaquim Barbosa.
RE 563708/MS, rel. Min. Cármen Lúcia, 14.10.2009. (RE-563708)
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