Com fiscalização deficiente, Adasa desconhece volume de água efetivamente retirado dos reservatórios do DF

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Brasília, DF, Brasil: Barragem do Descoberto, que operava com o volume útil de 23,7% nesta quarta-feira (13). (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

A auditoria realizada pelo Tribunal de Contas do Distrito Federal para fiscalizar a gestão de recursos hídricos no DF mostra que as falhas vão além do desconhecimento da Adasa sobre o total de usuários que captam água diretamente dos reservatórios e da defasagem dos dados usados como referência para o cálculo das outorgas. Também há deficiência na fiscalização exercida pela Agência em relação à quantidade de água efetivamente retirada dos reservatórios e às captações irregulares.

A norma que regula as outorgas para captação de água no DF prevê a obrigatoriedade de que todos os usuários detentores das autorizações instalem sistema de medição de vazão em cada ponto de captação e enviem periodicamente à Adasa os dados sobre a quantidade de água efetivamente retirada dos aquíferos. Entretanto, a Agência não detém controle gerencial e sistemático de quantos outorgados realmente instalaram hidrômetros ou medidores de vazão, nem do encaminhamento dos respectivos dados periódicos de leitura. Com isso, além de não saber se os usuários cumprem os limites estabelecidos na permissão, a Agência desconhece qual o volume de água efetivamente captado nos aquíferos do DF.

Nem mesmo para os grandes usuários, como a Caesb, são exigidas leituras periódicas de seus instrumentos de medição. Há apenas a análise pontual das leituras encaminhadas espontaneamente pelos usuários, que são comparadas aos dados da outorga. Quando é identificada alguma discrepância, o caso é encaminhado para a área de fiscalização. Além disso, a Adasa realiza fiscalizações in loco apenas nas bacias consideradas críticas, ou seja, que sofrem com baixa disponibilidade hídrica.

Ao ser questionada sobre o motivo de não cobrar dos usuários as medições periódicas, a Adasa informou que não existe sistema que torne automático o cadastro dessa informação, e que teria de registrar manualmente mais de 87 mil leituras de vazão ao ano, razão pela qual não exige dos usuários o fornecimento das leituras. No entendimento do TCDF, entretanto, as dificuldades administrativas não podem ser utilizadas como desculpa para abdicar de sua competência fiscalizadora e que a Agência deve buscar outras formas de fiscalizar o cumprimento das outorgas.

Outorgas vencidas –
Além de não verificar de maneira eficiente o cumprimento dos limites de captação estabelecidos nas outorgas, a auditoria também constatou a ineficiência das ações de fiscalização sobre as captações irregulares de água no DF. Essa incapacidade está relacionada tanto ao controle de outorgas vencidas quanto à identificação de captações feitas sem qualquer autorização. Em geral, a Adasa adora uma postura reativa em sua atividade fiscalizatória, atuando essencialmente sob demanda, sendo essas internas – decorrentes do planejamento da própria agência – ou externas – por exemplo, denúncias. E, ainda assim, os resultados estão muito aquém do que deveriam.

Segundo a própria Adasa, das 7.404 outorgas concedidas, 2.092 estavam vencidas em abril de 2018, o que corresponde a quase 30%. No entanto, não houve qualquer fiscalização da Agência para tratar desses casos em 2015, 2016 e 2017. Em 2016, o Plano Anual de Fiscalização da Adasa previa notificar 700 usuários com autorizações expiradas, mas nenhum deles foi notificado. Em 2018, quando a auditoria estava em curso, a meta era notificar 500 usuários com outorgas vencidas, ou seja, menos de 25% do total de usuários em situação irregular.

Captações irregulares – Ao analisar o Plano Anual de Fiscalização (PAF) de 2018 da Adasa, o corpo técnico do TCDF também não identificou quantas ações foram realizadas especificamente para identificar e coibir as captações feitas sem autorização do órgão. No eixo “Fiscalização Programada”, a ação que mais se aproxima do propósito de identificação de captações irregulares são as campanhas de regularização, que consistem em facilitar o acesso à Agência para os usuários interessados em regularizar a utilização de recursos hídricos. Porém, essa ação tem viés educativo e, além disso, estava restrita, em 2018, à Bacia do Rio Maranhão.

O corpo técnico do TCDF destaca que as cooperações da Adasa com outros órgãos ainda precisam ser reforçadas. Por exemplo, a Caesb poderia fornecer a localização dos hidrômetros das regiões atendidas pela concessionária, nome dos usuários, endereço e CPF, além dos dados de sua rede de monitoramento. Esses dados são necessários para identificação dos locais onde há fornecimento de água pela Caesb, uma vez que há proibição de outorga para consumo humano nas regiões com atendimento pela concessionária. Os dados de monitoramento são úteis para compor a rede da Agência de modo a aumentar a segurança no cálculo da disponibilidade hídrica.

A auditoria aponta ainda que a Adasa poderia firmar parceria com os Correios, para obter o endereçamento urbano e rural atualizado para auxílio na localização do local de captação, já que há dificuldade de identificação de alguns pontos exclusivamente por meio de coordenadas. A Agência também deveria buscar junto ao Instituto Nacional de Meteorologia (INMET) o compartilhamento de dados pluviométricos, estendendo a rede de monitoramento. O TCDF aponta ainda outras informações da Caesb, do Instituto Brasília Ambiental (Ibram) e da Empresa de Assistência Técnica e extensão Rural (Emater) que deveriam ser utilizadas pela Adasa para reforçar sua fiscalização.

Determinações – Como resultado da auditoria, o Plenário do TCDF determinou à Adasa que implemente mecanismos que garantam o monitoramento da medição de vazão de água efetivamente captada; defina sistemática de identificação de captações irregulares; estabeleça uma rotina para tratamento de outorgas vencidas, de modo a evitar o acúmulo de atos em situação irregular, bem como adote medidas para regularizar as situações já identificadas; e estabeleça convênios ou termos de cooperação com órgãos e entidades visando ao compartilhamento de informações estratégicas para a fiscalização e a gestão das outorgas.

O Tribunal também determinou à Caesb que compartilhe com a Adasa dados de sua rede de monitoramento de recursos hídricos superficiais e subterrâneos, e, ao Ibram, que compartilhe com a Adasa seu banco de dados de licenciamento ambiental e Cadastro Ambiental Rural, bem como outras informações que se fizerem necessárias, de modo a contribuir para a segurança do processo de concessão de novas outorgas. À Emater, o TCDF determinou o compartilhamento sistemático do cadastro das propriedades rurais do Distrito Federal e de áreas irrigadas para auxiliar na identificação de possíveis usuários irregulares de recursos hídricos.